Eu, eu mesmo em tu
Já se sentiu como se tivesse vários “Eus” dentro de você? Às vezes uma parte sua fica querendo que você aja de determinada maneira e a outra quer o contrário?
Através deste intrigante quadro podemos clarear algumas coisas sobre esses vários “Eus”. Aqui temos uma ilustração do livro sagrado indiano, o Baghavad Gita (400 A.C). É uma pintura clássica, que podemos associar a teorias junguianas.
É também uma representação gráfica de como o egoísmo deve ser combatido na nossa vida, de como o excesso e a má utilização do “Eu / Ego” podem nos atrapalhar. Numa perspectiva espiritual seria a ideia da centelha divina interna nos guiando, já para a psicológica é o arquétipo do Self no comando do corpo e da psique.
Vamos detalhar os símbolos e as representações arquetípicas que constam na ilustração.
Os cavalos representam nossos sentidos como o paladar, o tato, a visão e outros.
São os desejos e as ações que nos impulsionam. Os prazeres sensoriais, que por vezes nos levam para lugares e circunstâncias complicadas.
As rédeas são a mente em seu aspecto prático e superficial.
A charrete é o corpo, o aspecto físico.
Arjuna é o “Eu / Ego”, é o homem que está segurando um arco mais atrás. O Ego é uma composição de pensamentos, de sentimentos, de percepções e recordações.
Krishna é o Self, é quem aparece dirigindo a charrete, representa a idéia do Divino que somos, a luz transcendental que todos temos, o discernimento, a consciência superior e profunda, aquele que conhece tudo sobre todas as partes da charrete e do ser. O Krishna mitológico não é uma pessoa, é tudo e todos, é mistério.
A charrete ( nosso corpo) deve estar bem cuidada, para passar pelos obstáculos e seguir firme pelo caminho. Ela é movida pelas forças motoras, motivada pelos sentidos , ou seja, os cavalos. O fato de que cada um deles está olhando para uma direção diferente nos dá a percepção de que cada animal daquele busca algo distinto, cada um quer andar para uma direção, o que é péssimo para o equilíbrio da charrete. Podemos aprender com isso é que por vezes nós estamos perdidos com tantos estímulos que buscamos saciar, desfrutar de muitas coisas ao mesmo tempo. Se agradamos demasiadamente o paladar então comemos muito e engordamos, o que prejudica o corpo. Se ficamos até tarde agradando a visão com a tela do celular, o cérebro sofre e assim por diante.
É necessário que tomemos consciência do uso dos sentidos e dos desejos, para não nos afogarmos no mar de inquietudes que nós mesmos criamos. Daí a necessidade de algo para manter os cavalos juntos e para isso precisamos das rédeas, da mente. A disciplina deve manter a mente com a força correta, para se ter o equilíbrio da tensão entre manter as rédeas mais curtas ou mais soltas, dependendo de cada situação. Somente as mentes disciplinadas podem servir de instrumento para manter os sentidos e os desejos na direção correta. Aqui fica claro que nós não somos nossa mente, somos uma estrutura mais complexa com diversos modus operandis.
O ” Eu / ego ” está segurando um arco-flecha, por tanto não é ele quem vai guiar a charrete, logo não é o ego quem deveria guiar o homem. Vale lembrar que Ardjuna (eu/ Ego), no contexto da história que inspirou o quadro, está em um campo de batalha simbólico, a função dele é estar atento e observando. Então o “Eu/ Ego ” deve estar sempre pronto para atirar suas flechas naquilo que pode atrapalhar a vitória dessa batalha, que simboliza a luta espiritual. É ele quem luta para transformar as paixões, as emoções desequilibrantes e as crenças ilusórias que aprendemos em algo produtivo. A transformação das nossas sombras deve ser com equilíbrio, não é com a repressão e nem tão pouco com o abuso, é através da criatividade do verdadeiro discernimento superior.
O “eu / ego” está vendo tudo com humildade e por isso permitiu que o Self dirigisse a charrete. A difícil missão da direção do carruagem era de Krishna (Self), a consciência superior, é ela quem conduz tudo! O esforço de todos nós deveria ser o de manter nosso Ego forte e atento, mas ciente que o nosso Ser não pode ficar centrado nele. É preciso deslocá-lo para dar espaço para o Self guiar nossas vidas, pois nada melhor do que a luz do verdadeiro discernimento para nos conduzir, para guiar a mente, para ajustar o bom uso dos sentidos, para unir todos os elementos da nossa psique, e conduzir o “Eu |Ego” para a vitória evolutiva, rumo a felicidade!
Bibliografia:
Saudações a Krishna, o Belo; Shrii Shrii Anandamurti
JUNG O Mapa da Alma; Murray Stein
Assim, já não sou eu quem vive, mas Cristo vive em mim; Biblia Sagrada – Gálatas 2:20
A yoga do Bhagavad Gita; Paramahansa Yogananda
Lucas Lino