São 7 horas da manhã e estou na escola. A sirene toca anunciando o início da aula. Percebo a movimentação frenética dos alunos nos corredores. Eles sabem que é hora de entrar pra sala, mas relutam. Esperam os professores se aproximarem e dizerem: “Vamos entrar?” e só então se despedem dos colegas que também estão vendo seus professores os aguardando na porta da sala vizinha.
Resguardadas as exceções, entram na sala, sentam-se despojados, esperam pela chamada dos professores e respondem distraídos, uma vez que estão muito ocupados com a conversa paralela. Só então, abrem preguiçosamente as mochilas para retirar o caderno e a caneta (sim, porque mesmo que tenham um mundo de materiais, é o que retiram da mochila) e começam a registrar os conteúdos. Acaba o primeiro horário, o segundo, o terceiro. Finalmente, recreio. Novo sinal. Todos pra sala. Quarto horário, quinto horário e a sirene volta a tocar para anunciar o final de mais uma manhã de estudos.
Este é um retrato do cotidiano escolar. Os alunos nem percebem, mas nestes momentos, muito se aprende: a convivência com cada professor, as discussões inflamadas, a luta contra o sono para não cochilar em sala, sempre há um aprendizado contínuo.
Então, a pandemia. COVID-19.
Escolas fechadas, isolamento social, álcool gel, máscaras, notícias, fake news, índices, gráficos de mortos…
Na previsão inicial seriam quinze dias de isolamento, mas o tempo foi passando…
Surgiram leis e decretos, modificando e criando regras para um estudo remoto que mantivesse o aluno conectado à escola. Pet deixou de ser sinônimo de animal de estimação para ser Plano de Estudo Tutorado. A escola tornou-se virtual e as famílias entraram em cena.
No começo, os pais sentiram a dificuldade em disponibilizar o celular – utilizado como instrumento de trabalho ou meio de comunicação social – para que os filhos assistissem às aulas, fotografassem atividades, enviassem e-mails com perguntas e dúvidas. As dificuldades foram aumentando: saber o nome do professor do filho, em que sala ele estuda, quais as matérias do currículo e quantas aulas há na semana. E o horário da aula? “Envio a atividade para o professor às vinte horas porque é quando chego do trabalho, mas ele não me responde.” “Meu filho não fez a atividade porque disse que não estudou esta matéria.” “Ela não consegue dormir á noite e acaba tendo muito sono durante o dia. Confesso: eu tenho pena e deixo que durma. Acho que é ansiedade. Por isso, não está fazendo as atividades.” “Liguei para saber se meu filho entregou as atividades porque ele diz que fez e eu não sei olhar.”
Este novo cotidiano nos revela o quão distantes muitos pais se encontram de seus filhos. O artigo 227 da Constituição Federal de 1988 impõe primeiramente à família o dever de assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária. Posteriormente, este dever é direcionado à sociedade e ao Estado.
Também o Estatuto da Criança e do Adolescente de 1990, reforça no artigo 22 que “Aos pais incumbe o dever de sustento, guarda e educação dos filhos menores, cabendo-lhes ainda, no interesse destes, a obrigação de cumprir e fazer cumprir as determinações judiciais.”
A quarentena evidenciou a necessidade de reflexões. De qual patologia devemos cuidar? Que organismo está mais doente? O familiar ou o físico?
Talvez a vacina, a qual inúmeras famílias estejam necessitando, já exista: corrigir maus hábitos, incentivar mudanças, dialogar, aplaudir vitórias, criar regras e conscientizar para que sejam cumpridas. Disciplina. O estudo precisa disso. A aprendizagem também.
Édila Shirley de Almeida Campos
Coordenadora Pedagógica da
Escola Municipal “Professor Doriol Beato” em Conselheiro Lafaiete – MG